afinal ela chega ao fim do filme como estava no início, por isso não mudou nada

Esta Sexta-Feira 13 que acabara de passar, ofereceu-me uma experiência que jamais esquecerei. Pela primeira vez quando saí de uma sala de cinema, senti-me desolado. Não por ter assistido a um péssimo filme, mas sim pelo filme que teria acabado de ver, ter um conceito absolutamente devastador, uma realização soberbamente bonita que destribuí interpretações voluptuosamente memoráveis, e um efeito que causou em mim uma tremenda revolta por Slumdog Millionaire (Quem quer ser Bilionário? no título nacional) o ter vencido em ínumeras categorias naquela que considero a mais incoerente cerimónia cinéfila, os Óscares, onde um filme que nada contém para o merecer respectivamente, arrecada oito estatuetas, acabando inevitávelmente por roçar o rídiculo.
Refiro-me obviamente da mais recente obra prima do mestre David Fincher, O Estranho Caso de Benjamin Button, que, embora nomeado para treze Óscares só teria vencido três, entre as quais os prémios de mera simpatia e esquecimento por um filme de pobreza em conteúdo: Best Achievement in Visual Effects (Melhores Efeitos Visuais), Best Achievement in Makeup (Melhor Caracterização) e Best Achievement in Art Direction (Melhor Direcção Artística). Não falo da interpretação de Brad Pitt para um merecedor da categoria para Best Actor (Melhor Actor Principal), uma vez que perante os excelentíssimos nomeados pode ser empurrado para um patamar abaixo ainda que não subvalorizando o memorável trabalho que fez, mas sim da categoria de Best Motion Picture of the Year (Melhor Filme do Ano) (embora não tenha visto todos os nomeados, mas certamente a sua qualidade trespassava a de Slumdog Millionaire sem quaisquer dúvidas) e da nomeação, que não existiu, para Cate Blanchett, que já vencedora de um Óscar para Best Performance by an Actress in a Supporting Role (Melhor Actriz Secundária) n'O Aviador de Martin Scorsese.
Brad Pitt interpreta o inaudito Benjamin Button, um homem que nascera já totalmente envelhecido, e à medida que o tempo passa, vai rejuvenescendo, alimentando curiosamente uma personagem que convive com progressos de várias camadas de gerações, aprendendo a encarar a morte e a penúria do avançar da vida com um carinho extremamente dócil, pelo qual o espectador não fica indiferente. Entretanto, conhece Daisy (Cate Blanchett a mostrar de novo o seu incontornável dote) ainda pequena e quando era já idoso, vivendo assim com ela uma relação de um desíquilibrio surpreso, podendo apenas quando os dois se encontram numa idade similar, a casa dos 30, viver a sua paixão que ternamente nutrem um pelo outro.
O Estranho Caso de Benjamin Button não se limita a narrar uma história proveniente de uma fértil imaginação, mas com esta em braços, dá corpo a uma analogia de um poder astronómico que embarca sólidamente consigo, mensagens, momentos e diálogos que deixam uma marca não só na fascinante carreira de David Fincher e da respectiva equipa, mas na história global de todo o cinema que já se fez até hoje. Irradia sabedoria e entorna talento em todas cenas apresentadas, semeando consigo um filme que dá frutos para além do imaginável.
É nutrido por uma utopia que promove a distopia, ostentado por um insólito empenho cinematográfico e alimentado por um brilhantismo que circula merecidamente num pódio bem sinalizado.
E não, 3horas não são maçudas quando o ecrã é preenchido com esta Obra-Prima, tão delicada como duramente brusca e profunda que constrói uma fenda entre a juventude e a velhice a que nos é redondamente inevitável.
É, em suma, uma curiosa viagem que nos leva a mergulhar numa imensidão emocional onde tudo se aparenta escapar do nosso alcance, como que àgua por entre os dedos, e que jamais a poderemos recuperar.
Assemelha-se também a uma Orquestra. Após o pesado soar das cordas dos violinos, opõe-se-nos uma névoa negra irreversível que nos ensina que importante não é um fim do concerto mas sim o aproveitamento deste enquanto durava.
E assim, David Fincher faz magia de novo, porque afinal,
Life isn't measured in minutes, but in moments.
(a vida não é medida em minutos, mas em momentos.)

O MELHOR: A caracterização não só de Brad Pitt mas também de Cate onde é centralizada devido à narração feita pela sua filha já na recta final da sua vida e a derradeira mensagem que esta história nos conta. De frisar é também o paralelismo que é estabelecido entre as gerações das personagens, que oferece uma perspectiva eficaz de todo o conceito do filme;

O PIOR: A desilução que foi, mesmo para aqueles que já haviam desistido de seguir os Óscares, ter ganho apenas três;

MORTE SÚBITA: Slumdog Millionaire;

Dando num seguimento conclusivo e resumido à minha crítica, quando vi O Estranho Caso de Benjamin Button testemunhei numa singela cadeira de cinema, o que é ser-se de facto, íncrivel.
E aquando desta derradeira Obra, espero que mais filmes assim venham, embora reconheça que este seja eternamente e imparcialmente único. 10/10.

Chegou o veredicto final relativamente àquele que foi dos filmes mais falados de toda esta época na corrida aos prémios, senão o mais falado: Slumdog Millionaire.
Como já todos devem saber, o filme narra a história de Jamal Malik, participa no famoso concurso "Quem quer ser Milionário" e ao longo da sua atribulada participação, é suspeito por parte da polícia de fraude, por ser um simples jovem sem formação, e que alcança todas as respostas certas às respectivas perguntas. Jamal justifica todo o seu sucesso, narrando inteligentemente ao longo de todo o concurso as histórias da sua cruel vida e o que esta lhe preparou.
Posso afirmar que, depois de ter visto finalmente esta mediática película, as minhas expectativas corresponderam exactamente ao apreciamento final que formulei quando reflecti sobre a sua qualidade e o que esta representava.
Slumdog Milionaire possuí uma narração inteligente e uma fotografia deslumbrante, no entanto, não tem uma realização consólida com o argumento poderoso que detém, se assim o fosse devidamente utilizado e não sobrevalizado, erro do púbico e das entidades que o galardoraram; seria mais do que é, e não do que o fazem.
Slumdog Millionaire não é, nem está sequer perto de o ser, merecedor dos prémios que arrecadou não só nos Óscares mas também noutras cerimónias (que porventura ninguém quer minimamente saber). Danny Boyle limita-se maioritariamente a reproduzir um desfile que evidencia claramente cenas e planos reveladores da extrema pobreza que se viveu e ainda hoje se vive na Índia, e o público avassaladoramente adula, fazendo dele um filme de culto, que, diga-se, é de uma ignorância sólida. Já ouvi em ínumeros casos que Slumdog Millionaire mudou o pensamento de alguém, e que esse mesmo nunca tinha visto um filme que o ensinasse tanto como Slumdog o fez. Perante este (triste) facto, é-me crucial ponderar quatro alternativas para as pessoas que o afirmam:

a) Não teêm visto filmes desde as 20.000 Léguas Submarinas;

b) Não veêm Cinema de todo e a sua vida rotineira é redondamente aborrecida;

c) Teêm visto grandes filmes, mas a crítica incutida nestes é tão díficil (ou pelo menos requer o mínimo da atenção) de ser perceptiva, que só Slumdog Millionaire lhes oferece uma visão clara e fácil do que é duro e cruel;

d) Deixam-se arrastar pela onda do 'diz-que-diz';

Então Slum? Qual é a resposta?

O MELHOR: Um grafismo de luxo, incluindo cenas e planos fotográficos fabulosos;

O PIOR: O título português. Quem quer ser Bilionário? Seria certamente aceitável se fosse Milionário porque não há qualquer referência ao vocábulo Bilionário não só no livro mas também no contexto de todo o conteúdo do filme e do concurso representado;

E claro, a sobrevalorização já acima descrita;

MORTE SÚBITA: Diz-se que o filme seria um (triste) Direct-to-DVD. Um filme deste orçamento e com a assinatura do conceituadíssimo Danny Boyle? Não acham uma incoerência descomunal lançarem boatos destes para ganharem reputação?
5/10.

O Fabuloso Destino de Amélie não é só um filme, é muito mais do que isso. É a fecundação de uma delicadeza irrepremível, cuja não podemos renunciar, negar ou largar. É uma composição lírica aplicável a todas as formas artística do viver, é observar minuciosos gestos como que termos divinos, é nunca deixar morrer, nunca nos deixarmos ir. É assistir, tão de longe como de perto, o estrondear das ondas, o poder incandescente de pontos luminosos, o término da linha de comboio, o virar de páginas, o atirar de novas texturas e a formação de um novo quadro, uma nova etapa. É olhar óbices como desafios, olhar pavimentos vazados e atríbuir-lhes uma folhagem nostálgica, de variadas cores. É oferecer confianças ao desconhecido mais próximo e fazer dele uma chave a novas portas. É, sobretudo, viver do mais genuíno fruto que nos colocarem entre mãos.
O Fabuloso Destino de Amélie pavonea-se em movimentos feéricos, liquefaz-se num turbilhão de valores que prevalecem sobre qualquer assombro, cingi-se em exotismo. Naturaliza-se em portais inesperados, é efusivo no seu legado e depura objecções.
São bordadas em narração, proezas como a sua fotografia (Bruno Delbonnel), a banda sonora (Yann Tiersen), a decoração de cenários (Marie-Laure Valla) e claro, o realizador deste sonho: Jean-Pierre Jeunet. A rota europeia fora digirida em convergência e mergulhada em competência, e a fusão dos talentos de toda a equipa resultou em elegância e romantismo, especialmente no andar de intepretações.
Decorada por uma aura cativante, Audrey Tautou torna-se uma lenda. O seu olhar magnético e apaixonante semeiam as inocentes intrigas de Amélie, que aquando dos seus irremediáveis preciosismos, desenha retratos sociais peculiares, carismáticos e deliciosos. Mathieu Kassovitz como Nino, devora todo o mistério de identidades e acompanha com Tautou, toda a fustigante viagem à procura um do outro, embora já soubessem ambos onde se encontravam no fim.
Amélie crescera no seio de uma infância rasgada por burocracias e egoísmos familiares, e portanto, imíscuida de processos aconselháveis, expressa-se a partir de insólitas representações da realidade. E toda a sua vida fora assim, alimentada por subtextos solitários e aliviados por suavizações conformistas. Um dia, quando já adulta, descobre um enferrujado estojo no seu apartamento. Obcecada com a ideia de a devolver ao seu antigo dono, percorre listas telefónicas e recolhe testemunhos para encontrar o pretendente, onde todos que a rodeiam são meros itenerários na sua demanda, mas que a nutrem e reproduzem sentimentos fulcrais para que Amélie interiorize em pleno o quotidiano emotivo que afloresce diante dela. É nesta busca que se entende que fora concebida para aquilo mesmo. Sente uma transfigurada necessidade de reparar promenores na vida de vizinhos, conhecidos e estranhos até. É também esse engenho que utiliza para se auto-descobrir, e para descobrir também o seu amor, sempre presente, mas nunca desvendado.
À medida que o filme se alongava, saboreava cada sequência, cada momento, cada segundo.
Porque aliás, O Fabuloso Destino de Amélie não é um filme de uma vida, mas de várias.
Jean-Pierre Jeunet não elabora uma crítica à sociedade, mas admira-a; através do inesquecível olhar de Amélie Poulain.

O MELHOR: Audrey Tautou / Amélie Poulain;

O PIOR: porquê cortar o apelido de Amélie na tradução para o título em português?;